terça-feira, 10 de abril de 2012

CRÔNICA ESQUELETO

O Esqueleto e eu



         Antes de inventar de ser cronista eu era advogado. Morri baleado nos corredores criminais do segundo andar, graças a Buda! =) Um PM sacou a arma e começou a atirar e aí me joguei no chão, junto com sonhos e pastas,  muitos anos atrás, enquanto ainda era estudante e imaginava mudar o mundo. Íamos lá buscar restos de bobinas de papel, não sei explicar. Esses rolos carregávamos nos ombros até o carro (era o único no DCE que tinha um carro e por acaso, o mais moderado da turma). O estacionamento era lotado e esse material revolucionário não conseguíamos mobilizar, por quê? O tio do Zequinha (militante da Convergência socialista) era um dos diretores do Jornal O Dia e esses rolos nos rendiam muitas e muitas faixas de protesto que nós pintávamos pelo chão e passávamos horas discutindo os assuntos mais variados como a ida de Daniel Ortega a UERJ, a fome no Nordeste, as reformas do teatrão que nunca saíam, além de chavões e vícios do movimento estudantil. Aquelas questões de ordem me irritavam e anos depois descobri, visitando o Senado dos Estados Unidos, que as mesmas questões de ordem interrompiam qualquer orador... Perdido na administração daquele diretório, mesmo inexperiente, como quase todos, tentava levar idéias empreendedoras aos colegas, quase que na totalidade de esquerda e radicais. Em vão, fui me desligando, mas não sem antes convencê-los a organizar os espaços de xerox que garantiriam uma renda ao <movimento> e assim foi. Nos chamaram de volta para compor chapa e numa coalizão no Conselho Universitário, nessa época de redemocratização do país,  alunos, professores e funcionários conseguimos aprovar, não sem acaloradas discussões, a 1a eleição direta para Reitor e Diretores numa Universidade pública! Após UNICAMP, UFPE etc. Dois anos depois se bateriam Lula e Collor e nós que íamos para as ruas cedinho panfletar para Mário Covas, votamos de novo com o PT. Que época legal, não volta! Fazíamos passeatas, até no Cruzado acreditamos. Hoje se vota em gato, cachorro e papagaio, o dólar está caindo, a Nicarágua continua pobre, o São Francisco já tentaram desviar e meu espírito circula revistado pelos detectores de metal no Fórum, com heliponto para trazer presos chamados Beira-Mar e Carreira Alvins. Tudo tão confuso, no futuro trarão mais. Haverá videoconferências, Habeas Corpus on line e as petições serão distribuídas no drive thru. A imbecilidade no preenchimento de guias e taxas deve ser reduzida. Sei que as salas da OAB têm café forte pelas comarcas, que os divórcios dos sem bens são no cartório, os juizados pagam mini indenizações (um cala boca) e no Judiciário proibiram o nepotismo de excelentíssimas esposas que assinavam o ponto em casa. Meus Deus! Estamos melhorando? Criaram cotas para inclusão dos pobres que não estudam em escola particular! Bolsas no Prouni. Podemos falar e escrever o que quisermos, fundar qualquer partido a favor da vida e da cadeira elétrica! Alguns recém eleitos já se bandearam para a <base aliada>, terrorismo pior que este não há, não ter opinião, se vender por indicação, por migalhas de poder, como são ignorantes ainda... Precisavam viajar para longe de Brasília, ao Japão talvez e terem tempo de bastante ler. Lá o ensino é público do jardim à pós graduação.

                  Dirigindo em cima do viaduto do gasômetro (este eles não podem explodir mais) vejo a sede do JORNAL DO BRASIL, antes iluminada em luzes fosforescentes, completamente depredada e abandonada - um esqueleto e eu. O corsa é novo, o som digital, insufilm, celular v3 motorola que filma, posso filmar se quiser porque um dia estive ali e as rampas não caíam, e que importância tem o elevador? Os alunos continuam sorrindo: têm sonhos! Os funcionários continuam mal pagos, faltando professores e... Tudo parece bem, acho que existe um projeto do governo federal em parceria com o Cabral para transformar as ruínas em hospital de traumato-ortopedia: Oxalá ilumine esta idéia! Bem ali, próximo da rodoviária, onde todos chegam um dia imigrantes e seus filhos poderão se curar dos tiros e fraturas!



                                   Rio de Janeiro, 18 de maio de 2007.


 P.S. Dr.Guto reencarnou escritor, mas voltará com sua brava dog alemã na caminhada dos advogados.  =)